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Nem tão inocentes assim: queixas de problemas com a memória passam a indicar riscos.

Muito frequentes em pessoas que passam dos cinquenta anos, os “brancos” – que no inglês deram origem à expressão “senior moments” – não se restringem apenas aos cabelos. “Qual é mesmo o nome daquela vizinha?”, “O que mesmo vim buscar aqui na garagem?” e “Esqueci-me de fazer a transferência bancária!” tornaram-se frases habituais não só nessa faixa etária, mas em adultos que dormem mal, vivem correndo ou respiram estressados.

Senti a obrigação de escrever esse artigo porque há dois anos publiquei um livro justamente sobre memória e prevenção de uma doença terrível, que costuma assustar pessoas que apresentam esses esquecimentos cotidianos: a demência de Alzheimer.

No período de pesquisa que antecedeu ao lançamento do livro, ou seja, de 2010 a 2012, havia a tranquilidade científica de que queixas de memória não apontariam para risco aumentado de desenvolver problemas no futuro. Futriquei mais de duzentos artigos científicos e importei livros atualizados sobre o tema. Nas palestras deixava claro que três dificuldades eram esperadas com o envelhecimento: (1) episódios de esquecimento de objetos ou nomes não importantes, com posterior recordação (ex. nomes de conhecidos, médicos, artistas); (2) perda na habilidade de realizar diversas tarefas simultaneamente; e (3) uma aprendizagem mais lenta, ou seja, necessidade de maior esforço para adquirir novos conhecimentos quando comparado a jovens ou ao próprio desempenho anterior. Eu falava isso sem vacilar e percebi sempre que trazia um alento à audiência. No consultório, a conduta com os pacientes era sempre a de tranquiliza-los. Acontece que de 2012 para cá essas queixas subjetivas de memória passaram a ser objeto de publicações que indicam para um risco aumentado de problemas cognitivos futuros. E, agora, Dr. Leandro?!

Penso em continuar tranquilizando os pacientes que apresentam essas queixas – e acredito que seja a conduta mais adequada a todos os colegas médicos. Vale muito destacar que os pacientes que apresentam queixas de memória geralmente encontram-se com transtorno de humor (depressão), de ansiedade ou em forte estresse. Isso é tão verdade que as queixas cognitivas fazem parte dos critérios diagnósticos da depressão e um dos diferenciais que nos ajudava a distinguir em idosos quadros de depressão x demência era a espontaneidade da queixa cognitiva: a reclamação do próprio paciente sobre sua memória nos induzia a ir pelo caminho da depressão, não da demência. Agora, imagine você apresentar a um senhor já com depressão ou ansiedade os resultados de uma pesquisa que mostra que quem reclama da memória tem risco maior de Alzheimer. Não será nada produtivo e poderá ainda causar preocupações danosas!

A pesquisa mais recente sobre o assunto e que foi publicada agora em setembro, na conceituada revista Neurology, trouxe o resultado da observação de avaliações cognitivas e do estudo de cérebros de 531 idosos norte-americanos – a média etária no início do estudo foi de 73,2 anos. Cerca de 55% dos participantes passaram a reclamar de sua memória, fenômeno esse que demorou em média 8,3 anos para acontecer – na média aos 81,5 anos. Nesses, ou seja, em quem apresentava queixas subjetivas de memória o risco foi 2,8 vezes maior para problemas cognitivos (tanto comprometimento cognitivo leve quanto demência). Assim como essa pesquisa, diversas outras também apontam para essa mudança no paradigma que envolve memória e envelhecimento.

Provavelmente terei grande trabalho na reformulação da segunda edição do livro “Doença de Alzheimer: Como se Prevenir”. E digo isso não apenas devido a essa nova entidade “queixa subjetiva de memória” como novo fator de risco, mas devido à efervescência do assunto como um todo. O ser humano passou a ter uma vida bastante longa, com isso a memória afiada transformou-se em objeto de desejo, “sonho de consumo” de todos. Felizmente, a ciência mostra-se atenta a isso.

Por enquanto, porém, sem pânico.

E Dr. Leandro, mas o que fazer se não estou satisfeito com minha memória?

Procure um médico e, desde já, comece a praticar exercícios físicos regularmente.

Abraços!

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