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Idosos não param de me surpreender: a livreira de São Francisco de Paula.

Conhece algum idoso que te surpreendeu recentemente? Pelo contato profissional e pela abertura que tento ter para com as pessoas mais velhas, frequentemente me surpreendo positivamente. Vinha com a ideia de observá-los mais de perto e associar suas histórias de vida com conceitos importantes de gerontologia. Começo essa série de posts justamente com a Luciana, proprietária da Livraria Miragem, de São Chico.
 
Na sequência, até o dia primeiro de outubro – dia do idoso -, falarei sobre mestre de yoga Alício, meu avô Gelmi Francisco, a amiga e paciente Maria Conceição Weibert, o médium Divaldo Franco e o Papa Francisco.

Segue o primeiro dos textos.

 

Idosos não param de me surpreender. Recentemente, passei algumas horas na famosa livraria Miragem, em São Francisco de Paula. Encantado por livros, tive a oportunidade de conhecer a proprietária, a sonhadora Luciana. Aos 73 anos, confidenciou-me os motivos que a levaram a erguer o empreendimento, há quase uma década. Mostrou-me seus livros favoritos e, com o avançar de uma conversa de descobrimento, apontava-me quais eu deveria ler. “A Carta do Cacique Seattle, já leu? É imperdível!” “Adoro os russos. Falam de coisas da vida de uma maneira direta.” E, minha sorte não se resumiu à atenta recepção: honrou-me com acesso a seus planos, pediu-me, porém, segredo. Achei-os um tanto quanto ousados. Mas como duvidar de quem aos 64 anos decidiu resgatar a cultura numa pequena cidade, através do culto ao livro? Não me sinto em condições de julgar os sonhos alheios, muito menos de idosos com essa teima positiva de viver e realizar – e tem gente que ainda acha que chamar um idoso de teimoso está lhes ofendendo… Enquanto “especialista” em envelhecimento, coloco as aspas porque sou ainda um “rapaz”, lembrei-me de um conceito do Dr. Erik Erikson quando falava no oitavo estágio do desenvolvimento psicossocial. O legado, o valor de si para o mundo, está estampado na criação e na difícil manutenção da livraria, tarefa que lhe exige um especial cuidado. É a generatividade. É o que faz o ser humano chegar à velhice com a cabeça em pé e o coração no ritmo da leveza, independente de qualquer endurecimento de artérias. Pobre, assim diria Erikson, é quem envelhece sem ao menos acreditar que deixou alguma marca; e, no caso da Luciana, as marcas extrapolam o universo do livro. Em algumas obras por ela indicadas ao longo da conversa, percebi-a como uma ativista pela ecologia, em especial pela da dos campos de cima da serra. Campos nos quais havia passado a infância, criado um vínculo que agora resgata em projetos, fotos emolduradas e frases de alerta. Talvez, tenha ouvido os argumentos mais fervorosos e fluidos sobre sustentabilidade até o momento.  Para quem apenas passa pelos títulos, uma livraria encantadora. Felizmente, a abertura para uma troca me fez perceber que, muito mais que os livros, que histórias encerradas, ou mesmo que a arquitetura de madeira de bem gosto, a grande obra estava ali viva, Luciana. Um ser humano inteiro. Não inteiro por ser perfeito, mas por aceitar e viver duas condições que nos são fundamentais: cuidar de algo ou alguém e ter sonhos.

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(foto do site: http://viajeserragaucha.com.br/)

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