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Íntegra da entrevista sobre o dia do idoso para o Jornal NH

– Além de prática de exercícios e alimentação saudável, quais outros fatores influenciam para o envelhecimento com qualidade de vida?

Lembro do convívio social, da ocupação e de um cuidado permanente com o lado espiritual. Havendo um equilíbrio nesses aspectos, o papel do médico e dos exames preventivos acaba sendo secundário. Parece simples, mas a vida na terceira idade exige uma atitude de cuidado consigo mesmo e na relação com as outras pessoas e o mundo. Para alguns, é algo que já vem lá da juventude, chegam naturalmente à terceira idade com alegria e leveza de ser, mas para a grande maioria a velhice exige constante dedicação. Do Japão vem um termo interessante chamado ikigai – significa o motivo pelo qual se levanta pela manhã. Idosos com alto senso de ikigai, ou de sentido na vida, têm maior qualidade de vida. Pode ser cuidar de um neto, construir e cuidar de uma horta, escrever um livro, fazer um curso. Esse senso de sentido, de projeto, é, na minha opinião, a pílula da longevidade.
– Hoje, com a população vivendo mais tempo, mudou muito a imagem dos idosos. Vemos muitos “vovôs” e “vovós” com uma vida ativa, independente, até com ar mais jovial. Então, o que a gente pode dizer que é “ser velho” hoje em dia? Está mais relacionado a um tipo de atitude?

O “ser velho” no sentido pejorativo pode ser aplicado também aos adultos e até mesmos a alguns jovens. Por que não? Nesse sentido, está associado à rigidez, ao que acha saber de tudo ou que nada mais vale a pena. “Ser velho” é achar que apenas o seu tempo que era bom, ignorando o presente, o agora. O “velho” se fecha em si e ignora o novo.  O sentido pejorativo remete, sem dúvida, à tristeza e à improdutividade. Hoje, grande parte dessa geração pioneira de idosos no Brasil – a geração que hoje tem 70 anos ou mais – tem nos ensinado sobre o que é ser um idoso e todas as suas possibilidades. Eles vivem a vida, decidem, viajam, participam de grupos, namoram, prezam por sua independência. E, o que muitos esquecem, ajudam e muito seus filhos e netos.  Devemos, enquanto sociedade, muito a essa geração de idosos. Em menos de duas décadas mudaram a imagem do idoso no país.
– Qual a importância do exercício físico para a população idosa? E a partir de quando devemos nos preocupar com isso?

O exercício físico é fundamental na manutenção da saúde. Há todo um ganho cardiovascular, de manutenção do peso e, o que estudamos muitos em geriatria, na manutenção da massa muscular e óssea. As pesquisas comprovam que o exercício melhora o funcionamento da mente, podendo até mesmo ativar a produção de hormônios, como o GH e a testosterona. O exercício entra na questão do autocuidado necessário para um envelhecimento ativo.

Percebo que o sedentarismo se torna ainda mais danoso em quem passa dos 30 anos, 40 anos. Quem chega na terceira idade e não se movimenta está fazendo um escolha pelo adoecimento e pelos medicamentos.


– Como manter a mente ativa?

É uma combinação de muitos fatores:  evitar ou tratar a depressão;  praticar exercícios físicos, alimentar-se com verduras, frutas e gorduras saudáveis, com pouco açúcar; dormir bem; ter atividades que estimulem o cérebro e coloquem-nos em contanto com outras pessoas. O diálogo é um grande estimulante cerebral. E isso pode ser iniciado em qualquer idade, dos 70 aos 100 anos.
– E quanto à sexualidade? O que muda para o idoso e qual a importância da atividade sexual neste grupo?

A sexualidade na terceira idade, assim como na dos adultos e jovens, não se resume ao ato sexual em si. Ela é mais ampla, envolve cuidado com aparência e saúde, com a alegria de estar vivo e aberto para o outro. Percebo que a falta de informações sobre as alterações na faixa etária acabam por limitar e muito a satisfação dos idosos. Há ainda alguns tabus a serem derrubados e vergonha em levar dúvidas aos médicos. Sobre a importância da sexualidade, ou seja, de vivê-la no sentido amplo, ressalto que ela faz parte do conceito amplo de saúde. Destarte, é primordial incentivá-la. E quanto ao que mais se tem interesse, o ato sexual em si, trata-se de uma prática que traz sim bem-estar e deve ser estimulada.
– Todo mundo tem chance de ser um idoso ativo?

Preciso cuidar para responder essa pergunta, porque me remete sempre às dificuldades que muitos idosos enfrentam, como falta de acesso aos cuidados de saúde, famílias desestruturadas e pobreza – já que a maioria recebe apenas um salário mínino de aposentadoria. Envelhecer é uma construção que vem lá da concepção, do período intrauterino. O que fazemos da vida, as escolhas, e o ambiente no qual nos inserimos influeciam e muito no resultado da velhice individual.

Mas arrisco a dizer que sempre é possível partir para uma condição mais favorável, dentro das limitações individuais e coletivas. Há chances de se mudar um olhar sempre.


– Qual a melhor forma de lidar com as limitações da idade e como saber também que é a hora de aceitar ajuda?

A melhor forma de encarar qualquer limitação ou doença é buscar a transcendência. Quando se olha e se vive para fora se si, as dores são menores e suportáveis.  Idosos que, com os diagnósticos, tornam a doença como significante maior em suas vidas se tornam doentes. Ficam em risco de um ciclo vicioso de lamúria, diminuição da autoestima e do senso de autoeficácia. O contrário disso é ter doenças e limitações e não se ver como doente. Se consegue isso quando se vive para fora de si, com olhos para o mundo. Aceitar ajuda faz parte do autocuidado e de se aceitar enquanto humano, logo, frágil. Geralmente quem se cobra demais acaba tendo dificuldades em se deixar cuidar. Nos casos mais conflitantes que envolvem isso, costumo buscar ajuda também de psicólogos.


– Qual a importância da população idosa no contexto social?

 

Os idosos fazem parte da sociedade e farão cada vez mais. Não devem ser vistos como “gasto” ou um peso para os mais novos. A lógica neoliberal é perversa com os que envelhecem, em especial os pobres e as mulheres. Mas devemos olhá-los como detentores de enorme potencialidade. Eles contribuem com o exemplo, com a sabedoria e com sua capacidade marcante de cuidar dos outros. Vejam só quantos são voluntários em ONG’s? Nos idosos percebemos maior inteligência emocional, com mais tolerância, compaixão e paciência. E, em tempos tão difíceis como os nossos, não aproveitarmos tudo isso para tratar as nossas chagas sociais e individuais não é um grande desperdício? No mercado de trabalho e no cuidado com crianças e adolescentes já vemos que as pessoas com mais de 60 anos são importantes. Possibilitar essa troca intergeracional é urgente e dever de todos nós.

 

Jornalista: Gabriela Santos

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