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O que pode evitar o adoecimento de quem faz educação inclusiva?

Ontem estive presente na Escola Municipal João Freitas Filho, em Sapucaia do Sul, referência em inclusão. O convite para fazer uma fala com os professores partiu de uma dedicada ex-aluna da graduação. Tive essa valiosa experiência de ser professor universitário quando jovem e presenciar uma profissional engajada na educação inclusiva me renovou de esperança. Hoje ela trabalha na sala de recursos, para quem não sabe, é um atendimento individualizado para alunos com dificuldades de aprendizagem.

Comemorava-se a Semana da Pessoa com Deficiência e, na escola, houve atividades para familiares e para os professores.  O assunto que levei é o mesmo que tenho estudado e me dedicado nos últimos meses – espiritualidade e cuidado –, porém com o viés da docência, da inclusão e seu lugar num mundo excludente.

Acredito que cabem alguns comentários sobre essa relação próxima com a educação e com as escolas públicas, em especial na prática da inclusão.  Sou filho de professores, irmão de professora. Desde pequeno freqüento escolas públicas e continuamente tenho contato com muitos de seus desafios. Fui professor de psicopedagogia e fiz mestrado em educação. Hoje, enquanto médico, atendo muitos professores em situação de adoecimento e tantos outros que já se aposentaram. Posso afirmar que a questão da inclusão tem desafiado e muito a carreira de professores das escolas públicas, tanto que as taxas de adoecimento de quem a exerce é maior.  Há, por outro lado, muito sucesso. Cada profissional e cada escola tem dezenas de casos que comprovam o valor de uma postura inclusiva. Muitos municípios conseguem amparar seus professores de uma forma na qual os sucessos conseguem sobrepor os percalços e o cansaço que costumam desanimar educadores. Em outros cenários, falta formação, amparo de médicos especializados, estrutura e recursos humanos.

Falar sobre cuidado e compaixão com o grupo de professores que trabalham diariamente com inclusão foi válido pela tentativa de reforçar o propósito e situar sua prática num mundo desafiante e altamente excludente. A compaixão é essencial para a docência na educação infantil e básica – e é ainda mais presente no cotidiano de quem buscar entrar em contato profundo com realidades e necessidades especiais. Um aspecto que ilustra essa relação vem do adoecimento ligado ao trabalho do cuidar. Bastante comentada em gestão de pessoas na área da educação e dos profissionais da saúde, a síndrome do Burn Out tem como sinônimo justamente a síndrome da “fadiga da compaixão”.  Ou seja, com o esgotamento, se perde a capacidade de empatia e ação para aliviar a dor, o sofrimento, a necessidade ou mesmo a ignorância.

Um professor sem compaixão na sua prática entra num espiral de conflitos que aumentam ainda mais seu sofrer. Paulo Freire, em Pedagogia da Autonomia, elencava as condições para a prática educativa, que, enquanto especificidade humana, demandava querer sempre bem aos educandos, generosidade, alegria e esperança. Tudo isso, relaciona-se com a capacidade humana natural de compaixão.

Na mensagem final de apoio e esperança tentei deixar um possível antídoto para a síndrome do Burn Out. Falei sobre a importância da autocompaixão para transpor desafios individuais e coletivos. Se compaixão é uma capacidade humana, não se deve apenas entregar demais e descuidar de si próprio – isso mesmo, amar a si próprio, como está escrito. O olhar para si de uma forma terna e solidária, afastando o senso crítico exagerado e nocivo é um escudo contra a rotina carregada dos profissionais da inclusão. Temos limites, cometemos falhas, sofremos. A importância de falar do cuidado consigo e de se situar a importância da prática profissional se dá pelo freqüente adoecimento de quem trabalha com educação. Pelo que escuto e observo, o professor e a equipe diretiva costumam correr atrás de quase tudo para essas crianças e adolescentes e muitas vezes o trabalho realizado dentro da escola não avança mais devido às condições além dos seus muros. Fora isso, aqueles que acreditam na importância da inclusão, e se aperfeiçoam para exercê-la, às vezes enfrentam barreiras nos fluxos das escolas e até mesmo preconceito explícito de colegas que não defendem o modelo.  Somando-se a isso as dificuldades financeiras e o ainda descrédito nacional para com a classe, sabe-se que o estresse facilmente atingirá o professor em algum momento da sua jornada.

Professores são seres que superam continuamente estigmas sociais em busca de um futuro melhor, não somente para si, mas para o mundo de hoje e do amanhã.  Sobre vocação, acredite, ninguém consegue permanecer mais do que cinco anos em sala de aula se não for realmente vocacionado e tiver o coração frequentemente amolecido por sorrisos e o estômago embrulhado pela injustiça.

É preciso manter o coração sensível do professores, dando-lhes condições e escuta. Não devemos deixar que seus corações endureçam.

E você, o que pensa sobre essa a educação inclusiva? E de que forma a sociedade deveria tratar esses educadores?

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