Olá!
Hoje volto a falar sobre uma das doenças que mais tem causado medo na população: o mal de Alzheimer. Apesar de estarmos longe de compreendermos a totalidade dos fenômenos envolvidos no surgimento e progressão dessa terrível doença, felizmente a cada dia novas pesquisas são publicadas e aumentam nosso grau de compreensão. Quanto mais conhecemos esses mecanismos, mais podemos planejar e expandir nossas estratégias de prevenção.
Pretendo postar alguns textos falando justamente sobre como se prevenir dessa doença!
Um conceito muito importante que precisa ficar bem claro é o de que a Alzheimer é uma doença multifatorial. Isso quer dizer que em 95% dos casos a doença surge como resultado de uma série de alterações, não de apenas uma só. Como estamos falando em prevenção, isso é importante para que se entenda que é necessário tentar fazer uma abordagem preventiva também múltipla, focando diversos aspectos que levam à doença.
Basicamente, as alterações típicas da doença caracterizam-se por duas lesões associadas à perda na quantidade de neurônios: as placas beta-amiloides e os emaranhados neurofibrilares. Não se assuste com esses termos; logo você os estará dominando e se exibindo para seus familiares durante o jantar: “Não coma isso: esse tipo de gordura só aumenta suas placas beta-amiloides cerebrais.” Vá se preparando…
Essas duas alterações resultam nada mais do que da dificuldade dos neurônios em eliminar corretamente dois tipos de substâncias nocivas que seriam como “lixo” em nosso sistema nervoso. As principais alterações seriam, então, resultado de dois tipos distintos de acúmulo de lixo dentro do cérebro.
As placas beta-amilóides acumulam-se entre os neurônios e as células da glia, atrapalhando o correto funcionamento de ambos tipos de células. Infelizmente, além de ocupar espaço, essas placas irritam células ao seu redor, fazendo-as sofrerem, não funcionarem bem e, muitas vezes, morrerem. Ou seja, as placas beta-amiloides prejudicam a comunicação entre os neurônios e também o funcionamento daquelas células encarregadas de nutri-los, protegê-los e garantir seu bem-estar.
Hoje, sabemos que mesmo fragmentos ou pequenas partes dessas placas, chamados oligômeros, conseguem atrapalhar o funcionamento de regiões distantes à placa que os originou, inclusive causando outras lesões, como inflamação, e até mesmo favorecendo o surgimento de quadros de depressão no doente.
Já os emaranhados neurofibrilares são alterações dentro dos próprios neurônios, numa estrutura encarregada de dar sustentação e organizar a nutrição, chamada proteína tau. Assim como nas placas beta-amiloides, essa alteração leva ao mau funcionamento e à morte dos neurônios.
Até determinado ponto, chega a ser normal termos essas alterações em pequenas quantidades em nosso sistema nervoso, principalmente as placas beta-amiloides; tê-las não significa que somos ou seremos portadores da doença de Alzheimer. Elas começam a se desenvolver desde cedo, mesmo antes dos 40 anos de idade. Outro aspecto interessante é que em autópsias de idosos que faleceram sem comprometimento de sua inteligência, também foram encontradas essas placas. O grande problema é que nos acometidos pela doença de Alzheimer, essas alterações são muitas vezes em grande quantidade.
Para melhor compreender como surge a doença de Alzheimer, além dessas duas alterações, é importante entendermos outras quatro. Elas estão intimamente envolvidas no surgimento das duas principais mencionadas, as placas beta-amiloides e os emaranhados neurofibrilares; além disso, são extremamente prejudiciais ao sistema nervoso. São elas: inflamação, estresse oxidativo, glicação e alteração no metabolismo da insulina. O interessante é que quando duas dessas alterações estão presentes, seus efeitos são ainda mais prejudiciais, devido à potencialização deles. Existem diversas outras alterações em estudo que estão associadas à doença de Alzheimer, como a disfunção de uma parte das células, chamada mitocôndria, e na barreira hematoencefálica – que filtra as substâncias que entram ou saem do sistema nervoso –, porém, para fins didáticos, darei foco apenas nas alterações destacadas.
Inflamação
Ler a palavra “inflamação” provavelmente o tenha feito recordar as famosas medicações chamadas de anti-inflamatórios, usados principalmente para quadro de dores articulares ou musculares. Um dos usos mais comuns dos anti-inflamatórios é, por exemplo, nas dores no joelho. Ao batermos o joelho, ou quando temos a doença osteoartrite, o joelho começa a ficar inchado, vermelho e às vezes quente. Parece que o joelho passa a pegar fogo. Isso nada mais é do que a chamada resposta inflamatória (do latim, significa mesmo “atear fogo”).
É uma resposta do organismo contra alguma agressão, com o objetivo de reparação, para torná-lo, no caso do joelho, novamente sadio. Para isso, o sistema de defesa, chamado imunológico, libera substâncias que provocam essas alterações e fazem com que sintamos dor. Mas o tipo de inflamação à qual me refiro aqui não é bem a do joelho batido, que é a da forma aguda. Diferentemente, a que está envolvida na gênese da doença de Alzheimer se dá de uma maneira um pouco menos intensa, porém quase constante, permanente. É como se nosso cérebro ficasse também em chamas, porém numa temperatura menor em relação à do joelho batido (inflamação aguda).
Ao contrário dessa inflamação do joelho batido, a que acontece no sistema nervoso central e também em todo o organismo é apenas prejudicial – não trazendo nenhum benefício. Nela, é como se o sistema imunológico estivesse excitado, querendo combater um inimigo que não existe ou corrigir um ferimento que também não aconteceu. Há a liberação de substâncias, como as citocinas, que acabam prejudicando o funcionamento de diversos processos e células. A inflamação crônica no cérebro causa danos aos neurônios e às células da glia. Em algumas situações, ela até faz com que o hipocampo tenha seu volume reduzido, prejudicando, e muito, nossa habilidade de memorizar fatos e nomes.
A inflamação crônica do sistema nervoso, chamada de neuroinflamação, está relacionada com a origem das placas beta-amiloides, e as placas causam inflamação ao seu redor – como se fosse um círculo vicioso. Doenças como depressão, obesidade, transtorno do humor bipolar e o estresse também causam a neuroinflamação.
Um estudo recente deixa clara a relação entra inflamação sistêmica e o risco aumentado para demências. Realizado por um grupo de pesquisadores de São Francisco, nos Estados Unidos, ele analisou outros estudos que investigaram a associação entre indicadores sanguíneos de inflamação com o risco de desenvolvimento de demências. Os marcadores de inflamação pesquisados foram a proteína C-reativa ultrassensível (PCR-US) e a interleucina-6. Dos mais de cinco mil pacientes envolvidos na pesquisa, aqueles com níveis elevados de interleucina-6 tiveram um risco 32% maior de desenvolvimento de demência, enquanto os com a PCR-US alta, 45%.
Ao contrário da interleucina-6, o exame de proteína C-reativa ultrassensível é de fácil acesso nos dias de hoje, sendo realizado em qualquer laboratório de análises clínicas.
Ao reconhecer a doença de Alzheimer como tendo uma forte origem inflamatória, as atitudes mais inteligentes a serem tomadas são justamente aquelas que reduzem a atividade inflamatória. E como podemos conseguir esse efeito?
Grande abraço, Leandro Minozzo