Menu fechado

Surpreenda seu netinho

Minha família por parte de pai é da Serra gaúcha – região de colonização italiana conhecida pela agricultura familiar, qualidade de vida e longevidade da população. Meu avô mora no município de Paraí, que fica aproximadamente a 50 quilômetros de Veranópolis, cidade com fama de ser a  “terra da longevidade”. Diversas pesquisas já foram e vêm sendo desenvolvidas ali a fim de investigar os porquês dos habitantes viverem mais em relação aos de outras regiões do país.

 Meu avô tem 84 anos. Mora na região rural, ou como dizem aqui “na colônia” (seria o equivalente ao “na roça” em outras partes do Brasil). Desde que comecei a me interessar mais pelo estudo de geriatria e gerontologia e sobre questões de memória, passei a prestar uma atenção mais detalhada nas conversas com meu avô. Venho me surpreendendo com sua atualização sobre fatos acontecidos ao redor do mundo, opiniões sobre cenários políticos e comentários sobre futebol. Mesmo tendo o defeito de torcer para o Grêmio, ele sabe quase de cor a escalação do Internacional, dando pareceres de deixar comentaristas de rádio para trás. Recentemente, na época da eleição da presidenta Dilma, seus posicionamentos eram de uma lógica e clareza impressionantes. Alguns tios tentaram até iniciar discussões sobre política, mas não o venceram em nenhum argumento se quer. Ele fez paralelos muito interessantes entre momentos políticos de décadas atrás com o atual.

Com certeza, existem muitos intelectuais, ex-professores universitários, que têm mais idade do que meu avô e também surpreendem em suas falas. Mas o que me chama atenção é que ele mora num sítio, num município de 6 mil habitantes, cuida de cavalos a maior parte do dia, não usa internet e mesmo assim consegue se atualizar e manter sua linha de pensamento muito bem clara e elaborada. Meses atrás recebi uma notícia que talvez ajude a entender um pouco essa avidez mental do nono. Um tio que mora próximo disse que meu avô havia desenvolvido o hábito de assistir a duas televisões ao mesmo tempo. Ele colocou-as lado a lado e durante a noite, nos horários dos telejornais, assiste as duas simultaneamente. Questionado por meu tio, ele afirmou que era o jeito de treinar a mente e não pegar o Mal de Alzheimer.

 

Certamente, a estratégia que meu avô desenvolveu para se prevenir da doença de Alzheimer é bastante peculiar. Na verdade, prestar atenção à programação de dois televisores ao mesmo tempo não é uma tarefa tão fácil para os idosos. Com o envelhecimento, é normal que se reduza neles justamente a capacidade de se fazer várias coisas ao mesmo tempo. Mas, então, assistir televisão faz bem? Protege contra a doença de Alzheimer?

Depende.

Estudos associam o tempo gasto assistindo novelas e programas de auditório (esses do domingo e afins) na meia-idade com um risco aumentado para perda cognitiva na velhice. Os resultados desses estudos indicam que para cada hora diária assistindo televisão na meia-idade, há um aumento no risco de desenvolver Alzheimer em 30%. Meu Deus!

Ao longo de décadas cientistas vem tentando provar o porquê das mulheres terem mais a doença de Alzheimer do que os homens. Seriam questões hormonais? Níveis mais elevados de homocisteína? Anos aguentando o marido? Ou seria a maratona “Vale a Pena Ver de Novo, Malhação, novela das 6, 7 e das nove” a responsável por essa estatística desfavorável?

Tá bem. Não vou ser tão radical a ponto de condenar as novelas e os programas de auditório. Afinal, já tenho que me preocupar em orientar sobre atividade física, alimentação e estresse. Já sou taxado de inimigo de tantos hábitos, não preciso de mais um para duelar. Mas, então, surpreenda seu netinho vovó ou futura vovó: experimente assistir a duas novelas ao mesmo tempo.

 Um grande abraço!

 Leandro Minozzo

Post relacionado

2 Comentários

  1. Cléber Gonçalves Jardim

    Leandro, antes de tudo gostaria de congratulá-lo pelo desenvolvimento, que espelha a habilidade primaz para construçaõ da boa clínica, a observação perspicaz. Sendo esta dirigida ao “nono” então, faz nascer admiração mesmo antes de pessoalmente conhecê-lo.
    Quanto à dúvida sobre a atenção dispersiva como elemento preventivo ao mal de Alzheimer, creio que futuramente ouvirá do nono algo que o encherá de orgulho.
    Algo como : “Eu te falei, viu?!”… e certamente o netinho não ficará surpreso.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

× Agendar Consulta